sábado, 27 de março de 2010

Um olhar sobre o filme "sétimo selo"

Ingmar Bergmam tem como temática de seus filmes assuntos não muitos recorrentes em filmes comerciais, como por exemplo, a morte, humilhações, o amor visto sob outro olhar, existencialismo, medo. E o mesmo acontece com o filme Sétimo Selo que questiona a existência de Deus, que mostra a relação entre o homem e a morte, que procura entender a influência da religião na vida dos indivíduos, que lança a discussão sobre o bem e o mal. Isso tudo misturando cômico com dramaticidade.
Bergmam quis mostrar os questionamentos humanos e usou o cenário da idade média pra retratá-lo. Não poderia ter feito melhor escolha, pois o clima existente naquela época era de desilusão, medo e frustração.

Bergmam trouxe o cinema como caminho para a reflexão, não que ele tenha sido um dos primeiros a fazer isso na sétima arte. No entanto pode ser considerado inovador no seu tempo, pois assim como na década de 50 no qual era comum e quase necessário realizar filmes a cores e com temas do cotidiano ou de diversão. Ele trouxe para a tela do cinema um filme em preto e branco, onde o conteúdo era a obra prima que deveríamos observar. E a comprovação é percebida numa entrevista que o cineasta concedeu ao Instituto Sueco de Cinema que disse “Eu tenho uma enorme necessidade de influenciar outras pessoas, de tocá-las física e mentalmente, de me comunicar com elas. Filmes, claro, são um meio fantástico de tocar outros seres humanos, de alcançá-los, de irritá-los ou mesmo de fazê-los felizes, de deixá-los tristes ou de fazê-los pensar”.

O cineasta deixa explicito que não estabelece verdades e na cena em que o cavaleiro joga xadrez com a morte, é como que o jogo remetesse a uma busca.O xeque mate seria quando ele chegasse em algum lugar que sanasse a suas dúvidas. Portanto Bergmam não reduziu o problema de alguém que iria morrer, pelo contrário ele fez com se tornasse uma saga, talvez do seu próprio eu. Permitiu que as pessoas ao assistirem ao filme, procurassem repostas ou mesmo que apenas refletissem e para isso carregou a obra de indagações existencialistas.

Diante da crise de fé que o cavaleiro Block enfrenta depois que volta das Cruzadas, ao mesmo tempo mostra-se o ceticismo de seu escudeiro que se pode dizer que representa o esclarecimento, a visão critica que se tem de uma fé dogmatica.
È intrigante que o cavaleiro que teoricamente deveria representar um herói, e colocado como um homem comum e frustrados- rompimento de estereótipos- perante suas incertezas. A sensação de desprazer que este se encontra por agora está independente de uma religião que antes decidia sua vida. Nos mostra como a religião controla e torna mais fácil a vivência dos indivíduos a que a ela são submetidos.

Na cena em que o vassalo Jons se encontra com o pintor de paredes, ele pergunta para o artista por que ele pinta cenas tão aterrorizantes e diz que as pessoas não ficarão felizes, o pintor responde que as pessoas não têm de estar felizes o tempo todo. É perceptível que durante a trama Jons assumi e faz coisas que não são aprovadas pela sociedade. São desejos que ele sente necessidade de realizá-los, sem preocupar como a sociedade e a sua consciência irão lhe julgar. Já o cavaleiro Block vive de pequenos momentos felizes, como quando está reunido com os atores da trupe e seu escudeiro tomando leite e comendo morangos silvestres. Da mesma forma é a proposta da indústria cultural para o individuo, que tem que abrir mão da felicidade plena para viver com aquilo que a sociedade lhe oferece.

Bergmam experimenta e põem uma cena bem interessante, quando o ferreiro encontra sua mulher com o amante e os dois começam a discuti sobre o que iriam fazer um ao outro. E enquanto isso o vassalo Jons fica como narrador, ou até mesmo como se fosse alguém que assistisse a uma cena de cinema ou novela, dizendo o que cada um fará no momento seguinte. Não se sabe ao certo se isso foi intencional, no entanto é uma cena que pode trazer uma reflexão acerca a representação da indústria cultural na vida das pessoas, onde o individuo assiste a todo manipulação, às vezes, sabendo o que estar por vir nos “próximos capítulos”.

Assim como Walter Benjamim cita no texto “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica” que a “massas citaram os cinemas para assistirem à vingança que o intérprete executa em nome delas (...)”. O próprio Bergmam diz que seus filmes retratam os medos que ele possui e que com a sua retratação no cinema, pretende superá-los. Os medos que Bergmam possui em relação à morte, ele próprio diz que já amenizou.
Nesse mesmo texto Benjamin cita uma afirmação importante quanto à interpretação de atores “quando o interprete for tratado como um acessório cênico, escolhido por suas características, será o estagio final” referindo-se a dependência que os atores de cinema tem em relação a filmagens e aos cineastas. Com a era da reprodutibilidade a arte dramática é que mais sofre, pois cada vez se exige mais técnica na produção. O Sétimo Selo já tem um diferencial, pois foi rodado com poucas verbas, o que fez que algumas cenas não pudessem ser refeitas inúmeras vezes. E como exemplo tem a cena final da dança da morte, que foi gravada somente uma vez.

O Sétimo Selo mesmo sendo um filme de grande qualidade e considerado como um clássico é conhecido por poucos da massa. Talvez seja por ele não ser um filme que adestre o telespectador para esse, logo, se encontra em um lugar familiar ou que seja semelhante com a realidade. O que ocorre é o oposto, pois o filme é neo-expressionista, diferente daquilo que normalmente se encontra nas representações cinematográficas.
Com isso percebemos que para um filme ser apreciado-digo apreciado no sentido das pessoas gostarem ou não- tem que passar pelo circuito comercial. Pois o filme tem que antes de ser produzido, ter ‘quase’ a certeza que irá agradar ao gosto dos telespectadores. E na realidade ele tem que ‘acertar’, pois todos já sabemos qual a narrativa com os indivíduos estão acostumados e qual é mais simplista para ser compreendida.

Diferente dos filmes comerciais que tem finais superficiais, ou talvez até por vezes felizes, o Sétimo Selo possui um final que talvez não agrade a muitos e também não seja compreensível por todos. Mostra a morte do cavaleiro, do escudeiro e dos demais personagens- com exceção do casal de atores- aqueles talvez que tinham suas crises existenciais. No final do filme o gancho que se tem é que nem sempre na vida haverá respostas para as dúvidas do homem. E que no cinema pode acontecer o mesmo, não haverá sempre filmes que dêem uma reposta imediata e conclusiva para o telespectador.
A indústria cultural nos acostumou a filmes óbvios que até a encenação dos atores numa cena somos capazes de premeditarmos. No Sétimo Selo as atitudes dos personagens são carregadas de forte simbolismo, que inicialmente podem parecer ilógicas.
Apesar de o cinema ser taxado de produto alienante da indústria cultural, não se pode deixar de lado a importância que esse possui na vida das pessoas. E como que filmes iguais a este, podem nos trazer reflexões contundentes da existência humana e sua relação com o divino.

Nenhum comentário:

Postar um comentário